O fenómeno da demissão silenciosa não deixa de ser um reflexo dos níveis de distúrbios psicológicos da população, que aumentaram significativamente e do facto de muitos trabalhadores confessem que já não estão dispostos a “vestir a camisola” da empresa como antes.
Apesar de não ser um fenómeno recente, a chamada “demissão silenciosa” tem vindo a ganhar expressão no mercado de trabalho. Esta expressão, que advém do termo em inglês “quiet quitting”, refere-se ao estado de um trabalhador, que exerce o mínimo indispensável para manter o seu posto de trabalho. Ou seja, deixa de despender tempo, esforço, dedicação ou sequer entusiasmo nas suas funções, como se simplesmente desistisse.
Enquanto alguns afirmam que esta “demissão silenciosa” se trata de estabelecer limites entre a vida pessoal e a vida profissional, as acções que a identificam representam também uma enorme falta de motivação e envolvimento com a empresa. Assim sendo, estas acções incluem limitar a participação ao que é estritamente essencial ou preferir o silêncio em vez de participar activamente nas reuniões, por exemplo.
Perceber e estudar a demissão silenciosa
Os cientistas chamam de“desânimo adquirido” a este tipo de comportamento, que se manifesta após um período em que se sente que nada do que é feito tem importância. Desta forma, mesmo em situações onde exista controlo, alguém que esteja neste estado de desânimo adquirido tende a manter-se passivo.
Um estudo publicado na NIH em 2017 demonstrou como tudo funciona. Para isso, foram usados 2 grupos de pessoas e entregues a cada uma delas uma folha com 3 anagramas para resolver. Num dos grupos, os primeiros 2 anagramas eram fáceis e no outro grupo eram indecifráveis. O terceiro anagrama era igual para ambos os grupos. O que aconteceu foi que, quem resolveu os primeiros 2 anagramas, também resolveu o terceiro. Já no grupo em que os primeiros anagramas eram indecifráveis, os participantes nem sequer tentaram resolver o último. Isto deveu-se à frustração que sentiram ao tentar decifrar algo impossível. O pensamento passa, então, a ser “se nada resultou, para quê continuar a tentar?”
Estudo da National Institutes of Health
Mais recentemente, o neurocientista Steven Maier e as suas pesquisas sugerem que este desânimo é mais do que apenas uma resposta a circunstâncias que não se controlam. Em vez disso, é sintoma de uma adversidade prolongada, onde o cérebro parte do princípio que não existe controlo. Uma característica inata que se activa quando somos sujeitos a constantes experiências negativas de falta de controlo. Concluiu, assim, que em vez de ser uma característica adquirida, seria uma característica inata.
E isto tem implicações profundas, na medida em que significa que este estado de “desânimo adquirido”, não é verdadeiramente adquirido, mas sim uma resposta humana básica a eventos adversos.
Este “desânimo inato” e a consequente passividade explica facilmente o fenómeno da demissão silenciosa. As pessoas sentem stress permanentemente há anos, mas não podem/conseguem simplesmente abandonar as situações que o causam. Ou seja: sentem-se impotentes e acabam por responder tornando-se passivas.
Consequentemente, deixam de contribuir com ideias, de proactivamente tentar mudar a sua situação e até de procurar qualquer significado no trabalho, limitando a fazer apenas aquilo que é estritamente necessário para evitarem um despedimento. Felizmente, esta condição não tem de ser permanente.
Como combater a Demissão Silenciosa
Como podem, então, as empresas reverter esta passividade entre os seus colaboradores para reduzir o fenómeno da demissão silenciosa?
A resposta passa por dar aos trabalhadores mais autonomia, com o propósito de que se sintam no controlo das suas escolhas. Alguns exemplos são a possibilidade de:
- Definir o seu próprio horário ou prazos;
- Escolher o regime de trabalho, online ou presencial;
- Liberdade para seleccionar a sua própria equipa de trabalho;
- Terem uma voz activa na estratégia da empresa e na tomada de decisões;
- Etc.
Igualmente importante é encorajá-los a tomar as suas próprias decisões, sempre que tal seja possível, também se tem revelado uma boa estratégia. O cérebro humano anseia por fazer escolhas e vários estudos já demonstraram que a região do cérebro associada à antecipação e excitação se activa, apenas com a expectativa de poder fazer uma escolha ou tomar uma decisão.
Deixar que os colaboradores saibam que têm uma palavra a dizer, pode tornar o trabalho mais significativo, independentemente das funções que exerçam.
A demissão passiva só acontece quando os trabalhadores se sentem encurralados. Por isso, quanto mais liberdade têm, menos necessidade sentem de responder com improdutividade.